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O preço do vinho no restaurante

Manuel Moreira • jul. 18, 2023

O ponto de partida é sempre o mesmo, a comparação de preços entre negócios que são totalmente diferentes. Uma venda em prateleira não tem nada que ver com aquilo que é a tipologia de negócio do restaurante.

O preço dos vinhos no restaurante é tema que volta não volta regressa à baila. Sempre devido à margem “desonesta”, dizem os paladinos da sensatez. Eu não concordo de forma alguma. O ponto de partida é sempre o mesmo, a comparação de preços entre negócios que são totalmente diferentes. Uma venda em prateleira não tem nada que ver com aquilo que é a tipologia de negócio do restaurante. O certo é que markup, na maioria das vezes está correto, o problema é o resto, na percepção de valor. Vamos lá então.


 

Uma multiplicação por três e até quatro é normal e aconselhável. Já sei que aí vem o protesto! Quem percebe a sério de gestão desta área, e não a minha pessoa apesar da experiência que tenho na área, e como também figura nos manuais “considera-se uma percentagem de custos de matéria-prima de 30% como um bom indicador de gestão ao nível da atividade de restauração e catering (Davis et al., 2008)”. 


 

Ora bem, estes 30% de custos significam em média um markup (fator de multiplicação) de 3,3 pontos, que vai servir de indicador para encontrar o preço de venda de qualquer produto. Posto de forma simples, os 30% são somente o peso em forma de custo do F&B (comidas e bebidas). Falta acrescentar custos de muito peso como salários, renda, encargos bancários, consumíveis, energia, manutenção, limpeza, licenças e muitos outros que são satisfeitos, unicamente, através da venda de bebidas e das comidas.


 

O erro mais comum está em aplicar indiscriminadamente esse markup igual a todos os produtos. E no vinho, não se deveria aplicar esse markup igual a todos os vinhos, mas criar um mix de markups sem perder o objetivo dos 30% de vista. Por exemplo, e de uma forma simplista, há uns vinhos que têm de absorver mais “pancada” na margem e outros que são onde se encontram os melhores ofertas de valor para o cliente. Sempre fiz assim, como sommelier, como empresário da restauração, como consultor e os julgamentos de todos os lados sobre as minhas cartas de vinhos, foram sempre positivos.


 

Mas na verdade, é um autêntico quebra-cabeças o exercício de conseguir manter as margens dentro dos objetivos, distribuindo markups diferenciados que modo a ser, por um lado, sustentável economicamente ao mesmo tempo ser competitivo no preço e criar uma boa experiência ao cliente.

 


É que a atividade da restauração não mexe somente com valores monetários e produto físico, equipamentos materiais ou aspetos técnicos, mas envolve algo tão sensível como a alimentação, a segurança alimentar, tal como também engloba certas sensibilidades ao nível da percepção social, assim como incorpora um lado menos palpável, mais intangível como seja o serviço e uma interação constante com quem frequenta o restaurante e a eficiência, num entendimento diferente de cliente para cliente. 


 

E é este equilíbrio o que distingue e dificulta esta atividade. Talvez por isso, a taxa de aberturas e falências nesta atividade é assustadora. Já me tocou a mim. Tenho para mim que o charme percebido de cozinhar e de ter um restaurante, são a armadilha em que muitos se deixam aliciar. Mas adiante.

 


É por tudo isto que a restauração, chamemos, “clássica” não tem comparação com a maioria das outras atividades. Além de que cada negócio tem a sua especificidade e mesmo entre semelhantes há estruturas de custo diferenciadas. O que significa que comparar preços em negócios radicalmente diferentes é algo que não faz grande sentido.


 

Para além disso, o vinho está longe de ser dos produtos com mais margem num restaurante, ao contrário de uma certa ideia generalizada. Por ser um produto que não requer grande esforço de comparação, olha-se para o preço da prateleira e o do restaurante e, pronto, levanta-se a voz contra a margem. Isto deve-se ao facto de o vinho, e ainda bem, ser parte importante da experiência de ir “comer fora” e tudo o que com ele se relaciona, saltar à vista.



Mas não é feita a mesma comparação para com outros produtos. Barafusta-se sobre o markup do vinho, mas, por exemplo, paga-se alegremente um Gin Tónico com markups que são duas a três vezes superiores ao do vinho. E este é só um exemplo. Em suma, independentemente da transformação ou não, todos os produtos de f&b não têm que somente se pagar a si. Têm de contribuir para pagar todo o negócio.



Ora o cliente não quer saber nada disto. De como se calculam os preços, margens, etc. Embora faça comparações, é a experiência vivida que mede o seu grau de satisfação. E aí, é que a coisa muitas vezes corre menos bem. O conjunto de serviços dedicados ao vinho, em particular a temperatura, o copo e o maior ou menor profissionalismo das equipas desencadeiam uma determinada noção da percepção de valor.



Um preço do vinho num restaurante, muitas vezes com a margem bem calculada, se não for acompanhado da necessária criação de valor dada pelo serviço, resulta em insatisfação que por sua vez leva a todo o tipo de comparações. Justas ou injustas. Ou seja, a solução está à vista de todos.


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